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terça-feira, 6 de maio de 2014

Ser do bem ou ser bom?




O que importa nessa vida é ser bom!

Antes achava apenas que fazer o bem ao mundo era tudo... mas não.
Você passa a vida inteira perseguindo coisas: a pessoa ideal, o estilo de vida ideal, os amigos ideais e acaba descobrindo que as coisas acabam fugindo de suas mãos, simplesmente porque você não as pode reter.
É quando a vida te dá um golpe. Desmorona todo teu castelo -de cartas ou tijolos- e aí você percebe que tudo é transitório, e procura transcender a efemeridade, tentando consertar as coisas que você considera erradas à sua volta, se doando ao máximo e esquecendo seus próprios problemas. Pronto: você é um ser do bem!
É quando você mesmo se dá um golpe. A estrada rígida de tijolos amarelos que você andava se abre a seus pés... Você acaba de descobrir que não é super, muito menos iluminado e que a sua verdade não é tão verdade; você quer mudar o mundo mas não aceita ele quando é preciso mais compreender do que fazer o bem...
Pronto! nada mais é regra. Nada mais rege tua cabeça, todas as filosofias são vãs. Neste ponto começa época de perder-se, permitir-se tudo apesar da falta que você sente de um caminho delimitador.
Compreensão é a palavra. Abre diversas portas e permite ver mais de perto as mazelas - as suas e as do mundo. Desconstrói-se a condenação e a culpa. É como se você tivesse mais de mil pernas a trilharem todos os caminhos possíveis e já não é mais possível saber em qual destino chegar.
É como se você andasse ao acaso, dormindo ao relento; simplesmente vivendo um dia após o outro esperando chegar no resultado da soma de todas as suas experiências...
Dá para fazer diversas analogias neste momento, mas como a química envolvida no preparo de uma receita me atrai deveras, prefiro comparar a vida na terra a uma cozinha farta de todos os ingredientes possíveis -e você é o cozinheiro.
Prove todos os temperos e sabores que puder, mas só coloque na sua receita aquilo que seu paladar achar mais saboroso (atenção nesta hora pois o resultado final você vai ter que engolir sendo doce, amargo, salgado, ou delicioso), mas não se limite: permita-se experimentar. não se contente com apenas algumas provas -boas ou ruins- quanto mais você experimentar, melhor cozinheiro você será...
Vá colocando na panela, sentindo o cheiro, cozinhando, provando...
Não pense em cozinhar para agradar os outros, 90% da sua receita é você que vai saborear - os outros podem até experimentar, mas não muito, pois eles têm a própria mistura para digerir.
Mais do que cuidar o que os outros estão preparando atente-se ao que você está fazendo, não copie.
A palavra chave de todos os livros de receita é atenção. Este ingrediente dá certo em qualquer mistura.
Se o seu resultado for bom, você cumpriu a sua missão. Alimentou a si mesmo e pode dividir com todos aqueles que carregam apenas um copo do caldo amargo que decidiram fazer para eles mesmos.

Ter a consciência tranquila faz você perceber que fazer o bem ao mundo é uma consequência de ser bom primeiro consigo mesmo.

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Olhar de mãe

Encontro as pessoas na rua e paro para lhe ouvir as histórias.
Delas colho sorrisos e dissabores, alguns fracassos e sucessos, como a história da mãe que foi atrás de traficantes em seu reduto.
No local onde nem a polícia entra, impôs que não mais vendessem drogas a seu filho, sob pena de ela mesma, com a gana que tinha no olhar, acabar com o negócio ilegal do lugar.
Os chefes da boca e capangas, atônitos e inseguros das próprias atitudes perante tamanha presença - mas ainda assim empunhado armas atravessadas no corpo - responderam:
- S.. S...Só não te matamos por ter tido mais coragem que muito homem!
Então aquela mãe, com toda a força que lhe cabia, retrucou:
- Como? E por algum acaso existe algum homem com mais coragem que uma mulher?
Emudecidos e sem reação, viram ela dar meia volta com o olhar ainda flamejante e se foi.
É, não existe mesmo.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

O olho d'água



O olho dágua
expôs os vasos capilares da terra.
Viu
nos cabelos verdes da cabeça do morro,
viverem fauna e flora.
Presenciou,
quando lhe rasparam a verde juba;
sobre a cabeça fresca e colorida,
cresceram jazigos de concreto
(abrigo para as espécies de agora).
Viu
o asfalto lhe cortar as últimas idéias
e sobre o olho que,
rompendo o concreto
insistia em ver as mudanças,
posso dizer que chorou a última vez
(beijo de despedida no rio),
Na encomenda de sua morte química.
Não viu
Que sobre seu túmulo sem lápide
constam apenas listras,
como um enorme código de barras.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Unhas Vermelhas



        Aquela mulher me arrebatou de tal maneira que as marcas ficaram por todo meu corpo. Caminhava com seus pés macios e unhas pintadas de vermelho sobre minhas costas, me retorcendo a coluna e os músculos... meu corpo nú, de bruços à mercê daquela mulher me deixavam inseguro. 
        Foi quando virei a cabeça sobre o ombro direito e vi seus seios apontando, firmes - ela também estava completamente nua; Olhava para baixo enquanto caminhava pisando firme como se quisesse entrar pela cavidade de minhas vértebras; Seu cabelo caindo sobre o rosto não escondiam o sorriso de extrema satisfação daquele momento: o total domínio e o fato de me ver contorcendo sob seus dedos...
        Meu prazer estava dividido entre sentir a maciez da planta de seus pés e poder olhar de cima a baixo, pernas, pelos pubianos e seios que apontavam para mim... gozava visualmente sem poder puxar aqueles cabelos que pendiam do rosto, distantes de minhas mãos.
        Tentei me virar e agarrá-la com as duas mãos, mas ela pisou fortemente sobre minha omoplata esquerda e me manteve deitado, estático; Torceu meus dois braços e se ajoelhou sobre minhas mãos, me deixando completamente imóvel.
        Suas unhas bem feitas tinham um propósito sinistro: escrever sua história em minhas costas... Propósito ao qual me entreguei sem demora.
         Tinha agora minha pele sob suas unhas, incrivelmente bem feitas! Vermelhas também. Depois de me marcar o quanto quis, aproximou seus lábios carnudos sobre as feridas que havia provocado e pôs-se a lamber como cadela, vampira ou sei lá quê mais uma mulher daquelas me lembrava no momento. Suas lambidas ardiam mais do que curavam os ferimentos abertos; Um vermelho vivo, como se houvesse me açoitado... ela me cobria as costas de cima abaixo com a língua e eventualmente mordia.
        Já havia soltado os meus braços, mas não percebi pois havia entrado em êxtase naquele momento.
        sentia-a agora acariciando minhas nádegas com a ponta das unhas, mas não mais arranhava... E eu completamente entregue, imóvel, não mais precisava enxergá-la. Sentia sua respiração sobre mim, como uma presença forte e viva: o seu cheiro estava impregnado no ar...
Era o que me bastava.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Dissertando

A dissertação deserta
da ação
Tão certa que se faz
habita o deserto,
solo árido ao corpo;
afirma e contextualiza.
comprovado de certo,
apenas o que se sente na pele.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Carta aos membros da Academia Brasileira de Letras

Meus caros, onde está a vergonha que lhes restava na cara?
Medalha Machado de Assis, honraria máxima da academia, concedida a Ronaldinho Gaúcho...
Além de zombaria aos poucos que se aprofundam nas artes literárias, como pesquisadores, poetas, contistas, cronistas, professores e leitores dedicados, este é o carimbo da decadência e falta de respeito com uma instituição fundada por tão distinto nome da Literatura Brasileira.
Sarney, Collor, Paulo Coelho... e agora um pagodeiro!
Vou dormir e incluir na minha oração um pedido: Que quando o dia raiar eu acorde e descubra que foi tudo um grande pesadelo.
E se for realidade, peço que minha nave espacial venha me resgatar. Não tenho mais nada o que fazer aqui.

sábado, 30 de julho de 2011

Trapalhadas trágicas


Você confiaria a vida de sua família nas mãos dos três patetas? Não? pois 228 pessoas confiaram.

Patetas franceses, diga-se de passagem. Falo aqui do vôo do AF 447 da Air France.
Uma sucessão de trapalhadas e falta de respeito com a vida alheia causaram vítimas e muita dor às famílias.
Posso elencar algumas coisas aqui que deixariam qualquer um indignado:

1 - O Vôo mal levantou e o comandante foi dormir. Tirar uma pestana. Descansar, sabe? Tinha mal tempo à frente, mas não faz mal pois o avião estava em boas mãos: dois co-pilotos completamente inexperientes que ao menor problema ficaram perdidos igual a cachorro em dia de feira.
Só pra Ilustrar a situação dos co-piloCos:

Voce imagina estar viajando pra serra num ônibus de turismo, onde o veículo anda por desfiladeiros e estradas sinuosas... aí o motorista chama o sobrinho dele de dezesseis anos e diz assim: Guri, vou tirar um ronco, tu assume o busão pra mim. Ali é a embreagem... ali é o pisca... ali é o freio, no outro lado o acelerador... ah! a direção tu sabe como usar né?
- Claro tio! deixa comigo. qualquer coisa eu peço pro cobrador te chamar.

Imagina isso a dois mil metros de altitude.

Dá M.... isso né? Pois não foi o que achava o comandante do vôo do Air France. O cara foi tirar uma soneca e deixou os dois inexperientes no comando, só que o avião enfrentou tempo ruim ali na frente e o piloto automático parou de funcionar.

2 - Pra piorar, um dos dois trapalhões foi chamar o comandante quando o avião estava fora de controle, e o cara (comandante) achando que estava dormindo no sofá de casa de certo, levou preciosos 50 segundos pra levantar ( tempo que poderia ter salvo a vida de todos) e quando chegou na cabine, o monstro de metal estava em plena queda livre, sem sustentação nenhuma.
Pra elucidar um pouco mais:

Fonte: site de notícias G1

o Avião precisa de uma forte corrente de vento sob suas asas pra se manter no ar - é o que sustenta ele.
Se você mantiver o avião no ar sem mudanças bruscas de altitude, a base sob suas asas se mantém. O que aconteceu é o seguinte: Depois de o piloto automático ter pifado, os co-pilotos tiveram que assumir o controle manual. Sem experiência nenhuma, eles não sabiam se o avião estava subindo ou descendo. Confira um trecho da conversa gravada pela caixa preta. Este trecho da conversa começa com um dos co-pilotos (Robert e Bonin) apavorados esperando o comandante dorminhoco (Dubois) levantar:

23h 11 min 06 Robert: (*) Ele vem ou não?
23h 11 min 21 Robert: A gente tem ou não os motores, o que está acontecendo (*)?
23h 11 min 32 Bonin: Eu não tenho o controle do avião. Eu não tenho mesmo o controle do avião (*)
23h 11 min 38 Robert: Vire à esquerda
23h 11 min 41 Bonin: Tenho impressão que a gente conseguiu velocidade
23h 11 min 43 Barulho da porta da cabine
23h 11 min 43 Dubois: O que é que vocês fizeram?
23h 11 min 43 Robert: O que está acontecendo? Eu não sei o que está acontecendo

3- Durante toda a conversa atrapalhada entre os três, o aviso de ESTOL ( indicador de perda de sustentação) ficou apitando o tempo inteiro e eles não souberam identificar o que era o aviso.
Também o indicador de velocidade do avião havia sido obstruído por cristais de gelo ( proveniente da atmosfera por onde o avião viajava) e ninguém sabia mais dizer a que velocidade eles estavam.
Tal foi a confusão, que quando já estavam no nível do mar (1.200m), perto de colidir, eles achavam que estava a mais de 2.000m e haviam estabilizado.

Por que eu coloquei isso no blog? porque acho que existe muita falta de respeito e consideração pela vida dos outros. Poderia ser um familiar seu ou meu.

Se nos vôos franceses acontece isso, imagina nos brasileiros...

domingo, 17 de outubro de 2010

O lado certo do muro

Finalmente o PV se decidiu: Não vai apoiar ninguém.

Marina Silva tomou o mesmo rumo: deixar para o eleitor decidir em quem vai votar, sem causar nenhum tipo de influência aqueles 20 milhões de brasileiros que acreditaram nela, entre os quais, me incluo.

De um jeito ou de outro temos que sair de cima do muro, e as opções não são boas. De um lado, uma candidatura que preza pelo ser humano, pelo desenvolvimento do país, mas que para isso acontecer, passa por cima da natureza e das terras dos indígenas.
De outro lado, temos um candidato que preza pelas privatizações, que usa um modelo antigo de governo, mas disposto a fazer de tudo pela presidência, inclusive fazer dancinha no programa Pânico na TV.

Bem, para este eleitor convicto de Marina Silva o candidato a apoiar já foi escolhido, com base nas 10 propostas de Marina Silva e as respostas de Dilma e Serra para cada uma.

Minha sugestão: POR FAVOR ELEITORES DA MARINA, NÃO VOTEM NO SERRA.

Me justifico agora. Acabei de ler a tabela comparativa no G1 e o que li das propostas do candidato Serra é o tipo de coisa que eu jamais gostaria para o Brasil novamente (lembremos o grande privatizador e magnata de coração frio FFHH).

Por mais que algumas coisas do governo Lula ou da Dilma não nos desçam goela abaixo, NADA PODE SER PIOR QUE O SERRA.

Alguns pontos chave:
O SERRA NÃO TEM PROPOSTA QUE VISE TRANSPARÊNCIA DAS CONTAS DO GOVERNO.  A dilma tem.
O SERRA NÃO TEM UMA PROPOSTA SÉRIA PARA A ERRADICAÇÃO DO ANALFABETISMO.
A Dilma Tem.
O SERRA NÃO TEM NENHUMA PROPOSTA SÉRIA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL.
A Dilma concordou com as propostas de Marina e trata o assunto com seriedade.

Por favor, leiam a tabela inteira e tirem suas conclusões:

http://g1.globo.com/especiais/eleicoes-2010/noticia/2010/10/saiba-o-que-dilma-e-serra-ja-falaram-sobre-propostas-de-marina.html

Eu já tirei as minhas e me decidi. Bom segundo turno a todos.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Vem andar e voa...

Estava olhando aqui algumas coisas legais que eu já fiz e achei essa montagem com a música da Marisa Monte, que inevitavelmente me deixa de coração e mente mais leve em tempos mais pesados...

terça-feira, 6 de julho de 2010

Ritas e Caetanos

Li uma crônica pelo Professor José Ribamar da UERJ, que achei de muito bom gosto e me fez publicar aqui no blog. Acho que vale muito à pena ser lido.


A FOME DE MARINA ( Por José Ribamar Bessa Freire*)


Há pouco, Caetano Veloso descartou do seu horizonte eleitoral o presidente Lula da Silva, justificando: “Lula é analfabeto”. Por isso, o cantor baiano aderiu à candidatura da senadora Marina da Silva, que tem diploma universitário. Agora, vem a roqueira Rita Lee dizendo que nem assim vota em Marina para presidente, “porque ela tem cara de quem está com fome”.
Os Silva não têm saída: se correr o Caetano pega, se ficar a Rita come.
Tais declarações são espantosas, porque foram feitas não por pistoleiros truculentos, mas por dois artistas refinados, sensíveis e contestadores, cujas músicas nos embalam e nos ajudam a compreender a aventura da existência humana.
Num país dominado durante cinco séculos por bacharéis cevados, roliços e enxudiosos, eles naturalizaram o canudo de papel e a banha como requisitos indispensáveis ao exercício de governar, para o qual os Silva, por serem iletrados e subnutridos, estariam despreparados.
Caetano Veloso e Rita Lee foram levianos, deselegantes e preconceituosos. Ofenderam o povo brasileiro, que abriga, afinal, uma multidão de silvas famélicos e desescolarizados.
De um lado, reforçam a ideia burra e cartorial de que o saber só existe se for sacramentado pela escola e que tal saber é condição sine qua non para o exercício do poder. De outro, pecam querendo nos fazer acreditar que quem está com fome carece de qualidades para o exercício da representação política.
A rainha do rock, debochada, irreverente e crítica, a quem todos admiramos, dessa vez pisou na bola. Feio.“Venenosa! Êh êh êh êh êh!/ Erva venenosa, êh êh êh êh êh!/ É pior do que cobra cascavel/ O seu veneno é cruel…/ Deus do céu!/ Como ela é maldosa!”.
Nenhum dos dois - nem Caetano, nem Rita - têm tutano para entender esse Brasil profundo que os silvas representam.
A senadora Marina da Silva tem mesmo cara de quem está com fome? Ou se trata de um preconceito da roqueira, que só vê desnutrição ali onde nós vemos uma beleza frágil e sofrida de Frida Kahlo, com seu cabelo amarrado em um coque, seus vestidos longos e seu inevitável xale? Talvez Rita Lee tenha razão em ver fome na cara de Marina, mas se trata de uma fome plural, cuja geografia precisa ser delineada. Se for fome, é fome de quê?
O mapa da fome
A primeira fome de Marina é, efetivamente, fome de comida, fome que roeu sua infância de menina seringueira, quando comeu a macaxeira que o capiroto ralou. Traz em seu rosto as marcas da pobreza, de uma fome crônica que nasceu com ela na colocação de Breu Velho, dentro do Seringal Bagaço, no Acre.
Órfã da mãe ainda menina, acordava de madrugada, andava quilômetros para cortar seringa, fazia roça, remava, carregava água, pescava e até caçava. Três de seus irmãos não aguentaram e acabaram aumentando o alto índice de mortalidade infantil.
Com seus 53 quilos atuais, a segunda fome de Marina é dos alimentos que, mesmo agora, com salário de senadora, não pode usufruir: carne vermelha, frutos do mar, lactose, condimentos e uma longa lista de uma rigorosa dieta prescrita pelos médicos, em razão de doenças contraídas quando cortava seringa no meio da floresta. Aos seis anos, ela teve o sangue contaminado por mercúrio. Contraiu cinco malárias, três hepatites e uma leishmaniose.
A fome de conhecimentos é a terceira fome de Marina. Não havia escolas no seringal. Ela adquiriu os saberes da floresta através da experiência e do mundo mágico da oralidade. Quando contraiu hepatite, aos 16 anos, foi para a cidade em busca de tratamento médico e aí mitigou o apetite por novos saberes nas aulas do Mobral e no curso de Educação Integrada, onde aprendeu a ler e escrever.
Fez os supletivos de 1º e 2º graus e depois o vestibular para o Curso de História da Universidade Federal do Acre, trabalhando como empregada doméstica, lavando roupa, cozinhando, faxinando.
Fome e sede de justiça: essa é sua quarta fome. Para saciá-la, militou nas Comunidades Eclesiais de Base, na associação de moradores de seu bairro, no movimento estudantil e sindical. Junto com Chico Mendes, fundou a CUT no Acre e depois ajudou a construir o PT.
Exerceu dois mandatos de vereadora em Rio Branco , quando devolveu o dinheiro das mordomias legais, mas escandalosas, forçando os demais vereadores a fazerem o mesmo. Elegeu-se deputada estadual e depois senadora, também por dois mandatos, defendendo os índios, os trabalhadores rurais e os povos da floresta.
Quem viveu da floresta, não quer que a floresta morra. A cidadania ambiental faz parte da sua quinta fome. Ministra do Meio Ambiente, ela criou o Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo de Desenvolvimento para gerir as florestas e estimular o manejo florestal.
Combateu, através do Ibama, as atividades predatórias. Reduziu, em três anos, o desmatamento da Amazônia de 57%, com a apreensão de um milhão de metros cúbicos de madeira, prisão de mais 700 criminosos ambientais, desmonte de mais de 1,5 mil empresas ilegais e inibição de 37 mil propriedades de grilagem.

Tudo vira bosta
Esse é o retrato das fomes de Marina da Silva que - na voz de Rita Lee - a descredencia para o exercício da presidência da República porque, no frigir dos ovos, “o ovo frito, o caviar e o cozido/ a buchada e o cabrito/ o cinzento e o colorido/ a ditadura e o oprimido/ o prometido e não cumprido/ e o programa do partido: tudo vira bosta”.
Lendo a declaração da roqueira, é o caso de devolver-lhe a letra de outra música - ‘Se Manca’ - dizendo a ela: “Nem sou Lacan/ pra te botar no divã/ e ouvir sua merda/ Se manca, neném!/ Gente mala a gente trata com desdém/ Se manca, neném/ Não vem se achando bacana/ você é babaca”.
Rita Lee é babaca? Claro que não, mas certamente cometeu uma babaquice. Numa de suas músicas - ‘Você vem’ - ela faz autocrítica antecipada, confessando: “Não entendo de política/ Juro que o Brasil não é mais chanchada/ Você vem… e faz piada”. Como ela é mutante, esperamos que faça um gesto grandioso, um pedido de desculpas dirigido ao povo brasileiro, cantando: “Desculpe o auê/ Eu não queria magoar você”.
A mesma bala do preconceito disparada contra Marina atingiu também a ministra Dilma Rousseff, em quem Rita Lee também não vota porque, “ela tem cara de professora de matemática e mete medo”. Ah, Rita Lee conseguiu o milagre de tornar a ministra Dilma menos antipática! Não usaria essa imagem, se tivesse aprendido elevar uma fração a uma potência, em Manaus, com a professora Mercedes Ponce de Leão, tão fofinha, ou com a nega Nathércia Menezes, tão altaneira.
Deixa ver se eu entendi direito: Marina não serve porque tem cara de fome. Dilma, porque mete mais medo que um exército de logaritmos, catetos, hipotenusas, senos e co-senos. Serra, todos nós sabemos, tem cara de vampiro. Sobra quem?
Se for para votar em quem tem cara de quem comeu (e gostou), vamos ressuscitar, então, Paulo Salim Maluf ou Collor de Mello, que exalam saúde por todos os dentes. Ou o Sarney, untuoso, com sua cara de ratazana bigoduda. Por que não chamar o José Roberto Arruda, dono de um apetite voraz e de cuecões multi-bolsos? Como diriam os franceses, “il péte de santé”.
O banqueiro Daniel Dantas, bem escanhoado e já desalgemado, tem cara de quem se alimenta bem. Essa é a elite bem nutrida do Brasil…
Rita Lee não se enganou: Marina tem a cara de fome do Brasil, mas isso não é motivo para deixar de votar nela, porque essa é também a cara da resistência, da luta da inteligência contra a brutalidade, do milagre da sobrevivência, o que lhe dá autoridade e a credencia para o exercício de liderança em nosso país.
Marina Silva, a cara da fome? Esse é um argumento convincente para votar nela. Se eu tinha alguma dúvida, Rita Lee me convenceu definitivamente.

(*) Professor, coordena o Programa de Estudos dos Povos Indígenas (UERJ) e pesquisa no Programa de Pós-Graduação em Memória Social (UNIRIO)

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